sexta-feira, 1 de outubro de 2010

Oxaguiã manda libertar o amigo preso injustamente



O filho de Oxalufã tornou-se um guerreiro forte
e decidiu um dia conquistar um reino para si.
Partiu em companhia de seu amigo Auoledjê.
Conquistou Ejigbô, tornando-se seu rei, Elejigbô.
O rei tinha uma grande paixão, comer inhame pilado.
E comia com gula, tanto que o chamavam Oxaguiã,
que quer dizer "Oxalá-Comedor-de-Inhame-Pilado".

Um dia Auoledjê, que era um grande babalaô,
precisou partir de Ejigbô.
Antes disso, aconselhou Oxaguiã
que fizesse oferendas,
que tornariam o reino próspero.
Assim, como previa Auoledjê,
Ejigbô tornou-se uma grande cidade,
rica e bem guardada pelos bravos soldados de Oxaguiã.
O rei Elejigbô vivia em fausto entre os súditos,
por quem era chamado de "Kabiyesi",
que é o mesmo que Sua Majestade.
Na intimidade os amigos o chamavam de "Comedor-de-Inhame-Pilado",
mas em público isso era uma heresia.

Anos mais tarde, Auoledjê retornou a Ejigbô.
Ao adentrar a cidade, procurou logo por Oxaguiã.
"Onde está o Comedor-de-Inhame-Pilado?", perguntou.
Os soldados, que não o conheciam,
ficaram furiosos com tamanha insolência.
Isso era jeito de se referir ao rei?
Prenderam e maltrataram o desconhecido amigo de Kabiyesi.
Auoledjê ressentiu-se da humilhação.
Com seus poderes mágicos, vingou-se.
durante sete anos todas as catástrofes conhecidas,
e não faltando a seca, assolaram o reino de Oxaguiã.

Oxaguiã, desesperado, procurou os adivinhos.
E pelo oráculo eles viram a prisão de Auodjelê.
Um amigo do rei estava preso injustamente.
Oxaguiã correu para a prisão para libertar o velho amigo.
Oxaguiã libertou-o,
mas o amigo, ainda ressentido, escondeu-se na mata.
Elejigbô buscou o velho amigo, suplicando seu perdão.
Auodjelê cedeu com uma condição:
que nunca aquele povo se esquecesse dessa injustiça.
Todos os anos o povo deveria flagelar-se,
em memória do funesto acontecido.
Assim, todos os anos,
o rei deveria mandar muitas pessoas à floresta cortar varetas.
os súditos, divididos em dois grupos, tomariam as varas,
simulariam golpes uns nos outros, sem parar,
até que as varetas se quebrassem.
Para que nunca se esquecessem daquela injustiça
praticada contra o amigo de Oxaguiã.
Assim foi feito e o reino de Oxaguiã voltou à tranqüilidade
e Oxaguiã foi o maior dos reis de Ejigbô.
Quando ele foi para o Orum, transformado em orixá,
seu culto não se esqueceu do velho amigo babalaô.
Com as varetas de Oxaguiã, com os atoris,
seus adeptos renovam sempre a memória da injustiça,
para que ela não volte a acontecer.


[Notas Bibliográficas e Comentários]


Transcrito do Livro Mitologia dos Orixás de Peginaldo Prandi, publicado pela Cia das letras, págs 491-2. Originalmente encontrado e/ou transcrito de Pierre Verger, 1981 (b), pp. 64-8; Verger, 1985, pp. 65-7. No Brasil e em Cuba, Oxaguiã é cultuado como qualidade de Oxalá-Orixalá. É dito Oxalá Jovem no Brasil e O Velho em Cuba. Na África é uma divindade independente. Na África, até hoje, todos os anos no final da estação da seca habitantes de dois bairros de Ejigbô reúnem-se e batem-se com varetas durante todo um dia, a fim de representar sua súplica para que a chuva retorne. Nos candomblés, tal costume é reproduzido no ciclo de festas em homenagem a Oxalá ( as Águas-de-Oxalá), especialmente na parte reservada a Oxaguiã (o Pilão de Oxaguiã), quando os devotos do terreiro se dividem em dois grupos que se batem com as varetas (atori), em rito de expiação.


Atori [àtòrì] - Vareta usada para flagelação em cerimônia a Oxaguiã; representa os ancestrais; vara da árvore africana Glyphaea lateriflora.


Axé a todos os nossos irmãos!
Deus é tudo acima de todas as coisas!
Olorum Colofé!

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