Iemanjá foi mãe de dez filhos,
fruto de seu casamento com Olofim-Odudua.
Cansada da vida em Ifé, Iemanjá partiu para o Oeste.
Iemanjá assim chegou a Abeocutá.
Lá conheceu Oquerê, rei de Xaci.
Conheceu Oque-rê, Oquê.
Oquê, encantado com a sua beleza, propôs-lhe casamento.
Ela concordou, desde que ele nunca fizesse alusão a seus seios,
seios que eram grandes, fartos, volumosos.
Porque Iemanjá havia amamentado muitos filhos.
Em troca, Iemanjá nunca falaria dos defeitos de Oquerê.
Não falaria de seus testículos exuberantes,
de sua mania de beber demais,
nem entraria em seus aposentos pessoais.
Esses eram os tabus de Iemanjá e Oquerê.
Um dia, Oquerê voltou para casa embriagado,
tropeçou em Iemanjá, vomitou no chão da sala.
Iemanjá o reprimiu, chamando-o de bêbado.
Chamou-o de imprestável.
Oquerê perdeu o domínio das palavras.
Ficou enfurecido.
Oquerê ofendeu Iemanjá,
fazendo comentários grosseiros sobre os imensos seios dela.
Iemanjá lembrou-o dos defeitos dele,
como ele bebia, como tinha exagerada a genitália.
Entrou no quarto dele e apontou a confusão que lá reinava.
Não havia mais reconciliação possível.
Todos os tabus estavam quebrados.
Oquê quis surrar Iemanjá
e ela fugiu.
Iemanjá saiu em fuga para a casa de sua mãe Olocum.
Iemanjá tinha um presente que ganhara dela,
uma garrafa com uma poção mágica, que levou consigo.
Na fuga, Iemanjá derrubou a garrafa e dela nasceu um rio,
que levaria Iemanjá ao mar, a casa de sua mãe.
Assim Iemanjá iniciou seu curso em direção ao mar.
Mas Oquerê, que a perseguia, tentou impedi-la de abandoná-lo.
Transformou-se ele próprio numa altíssima montanha,
que impedia o curso de Iemanjá em direção ao mar.
Oquerê transformou-se em Oquê, a montanha,
para impedir que Iemanjá, o rio, corresse para o mar.
Iemanjá chamou em seu auxílio Xangô, seu filho poderoso.
Xangô pediu oferendas e no dia seguinte provocou a chuva.
E quando a tempestade era forte, Xangô lançou um raio,
que num estrondo dividiu o monte Oquê em dois,
formando um vale profundo para a passagem de sua mãe, o rio.
Livre, Iemanjá seguiu para a casa da mãe dela, o mar.
Assim Iemanjá Ataramabá foi aconchegar-se no colo de Olocum.
[Notas Bibliográficas e Comentários]
Transcrito do Livro Mitologia dos Orixás de Reginaldo Prandi publicado pela Cia das Letras, págs 383-5. Originalmente encontrado em William Bascom, 1980, pp. 45-6, 489-93; Pierre Verger, 1981 (a), p. 190; Verger, 1981 (b), pp. 59-63; Verger, 1985, pp. 50-2; Agenor Miranda Rocha, 1994, pp. 83-4. variantes deste mito dizem que Iemanjá teria entrado num quarto proibido do palácio de Oquerê, buscando comida para seus hóspedes, e que seu marido teria então ridicularizado os fartos seios da esposa. Iemanjá replicara fazendo alusão aos enormes dentes de Oquerê e, noutra variada, fazendo pouco de seus desproporcionais testículos. Mito mito parecido ao de Otim. Noutra versão, o marido é Ogum (Ulli Beier, 1980, pp. 45-6). Em muitos candomblés, a Iemanjá aqui descrita corresponde à qualidade Ataramabá.
Axé a todos os nossos irmãos!
Deus é tudo acima de todas as coisas!
Olorum Colofé!
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